Gosto não se discute, cada um tem o seu. O vinho é uma questão de prazer pessoal e é perfeitamente normal avaliar uma garrafa segundo o critério gosto/não gosto. Mas, saber analisar uma bebida além do gosto pessoal é o que diferencia um apreciador de um verdadeiro conhecedor.
“O connoisseur é aquele que, depois de uma degustação, é capaz de dizer: ‘É excelente, mas eu não suporto este vinho’”, diz o renomado crítico norte-americano Matt Kramer no livro Os Sentidos do Vinho. Ou seja, ir além das impressões subjetivas é o primeiro passo para definir se um vinho é melhor que outro. Veja as características que identificam a qualidade do vinho.
Complexidade
A psicologia experimental já mostrou que reagimos favoravelmente à complexidade. Com o passar dos anos, o nosso gosto musical geralmente progride do mais simples ao mais complexo. O mesmo ocorre com o vinho.
Um vinho complexo é o que revela diversas camadas de aroma e de sabor. Isso ocorre por diferentes motivos, como a seleção das uvas, os cuidados no processo de produção e o estágio de envelhecimento.
Os vinhos mais complexos são os que vão além dos chamados aromas primários, isto é, os da própria fruta. A uva Sauvignon Blanc, por exemplo, costuma ter notas vegetais, como de grama cortada.
Já os aromas secundários vêm da elaboração do vinho e nascem durante as reações causadas por leveduras e bactérias. Por exemplo, o aroma amanteigado do Chardonnay é criado por uma bactéria específica durante a fermentação do mosto.
Por fim os aromas terciários se criam na etapa de envelhecimento da bebida. O amadurecimento em barricas de carvalho costuma acrescentar notas tostadas, de baunilha, chocolate ou de nozes, entre outras. Mas existem outras formas de envelhecimento, por exemplo, em ânforas ou cubas de concreto, que agregam outros aromas e sabores.
Aprender a perceber a complexidade de um vinho é o primeiro passo para deixar de ser um apreciador comum e se tornar um verdadeiro conhecedor.
Equilíbrio
O equilíbrio é um fator chave do vinho. Aqui entram em jogo várias características, como acidez, dulçor, taninos e álcool. Dê um gole e tente identificar cada uma dela. Para se ajudar pode classificá-las numa escala que vai do nível leve ao alto, passando pelo intermédio.
Apesar de, à primeira vista, parecer uma característica negativa, a acidez é a espinha dorsal de um vinho. É aquela sensação de frescor que a bebida deixa na boca. Identificá-la é bastante simples: um vinho com acidez faz salivar. O resultado é que cada gole pede mais um e o paladar não fica cansado.
Vinhos doces – como os de sobremesa, os fortificados e os espumantes doces – têm níveis de doçura elevados porque assim foram elaborados. Mas de forma geral, a doçura tem que ser equilibrada em relação à acidez e nenhuma das duas características deve se sobressair.
Já o álcool precisa estar bem integrado à bebida, ou seja, mesmo que um vinho tenha um teor alcoólico elevado, ele não deve aparecer mais que outros atributos. Se a bebida deixa uma sensação de calor na boca e na garganta quer dizer que o álcool não está bem incorporado.
Os taninos são polifenóis encontrados na casca das uvas tintas e, por isso, são encontrados nos vinhos tintos e, eventualmente, nos rosés. Eles dão aquela sensação de boca amarrada, mas não são todos iguais: às vezes são mais redondos e macios, outras mais rústicos e ásperos. Num bom vinho é essencial que os taninos sejam equilibrados.
Finesse
A finesse ou fineza é uma característica difícil de definir, mas resulta da evolução do gosto. Antigamente, os vinhos eram rústicos, turvos, desequilibrados e tinham corpo e cor leves. A evolução enológica elevou exponencialmente a qualidade da bebida e refinou o nosso gosto.
“Hoje, nosso critério para a finesse está impregnado da apreciação de uma grande e complexa profundidade no sabor do vinho [..] Hoje em dia, um vinho com finesse é aquele que apresenta uma harmonia particularmente impressionante de seus elementos”, diz o crítico Matt Kramer.
Vinhos de todos os corpos e teores alcoólicos podem ter finesse, mas ela é mais facilmente alcançada nos vinhos brancos, sobretudo os mais delicados. Já nos vinhos potentes e encorpados a fineza é mais difícil de se obter e, por isso, quando o resultado é alcançado estaremos diante de vinhos excepcionais.
Nos grandes Cabernet Sauvignon do Chile, nos Malbec argentinos, nos Nebbiolo e Barolo do Piemonte, nos Pinot Noir da Borgonha e nos cortes de Bordeaux é possível perceber toda finesse que um vinho pode alcançar.